05 de outubro de 2022

Na mitologia grega, todos os rios são deuses. Isso explica a persistência da memória, a importância da morte, o valor da caminhada. Tudo isso, na Grécia, é representado por água que passa, leitor. Não à toa, não se pode banhar-se duas vezes no mesmo Rio e é, por isso, que não se pode voltar ao futuro nem chegar no passado. Se vou ao futuro querendo passado, só me resta morte - a morte da lembrança. Eu não posso abrir duas vezes o mesmo portão, já não sou eu a mesma nem, de certo, o portão. Não posso dormir duas vezes na mesma cama nem, sequer, abraçar meu pai duas vezes iguais. Não posso repetir, só posso transformar. Só posso admitir do tempo a sua alquimia, nos idos de 2018, defendi meu TCC, nele, entrei pelos terrenos duros da alquimia mesma, tudo para explicar a minha alma e conheci a transmutação, essa mudança em matéria, circunstância e natureza. Sinto que estou neste caminho de escrever para me transmutar, transformar-me em qualquer coisa sempre nova, como a poesia. Mesmo que eu leia "Formoso Tejo meu..." pela milionésima vez, essa vez me é primeira e as palavras vem a minha boca com diferente gosto; hoje, parece que estive um dia no Tejo, loucura minha, leitor... talvez o que eu sinta seja a saudade da cadeira catedrática em que li pela primeira vez o Tejo, que vi pela primeira vez o Tejo, que pude quase tocar meu dedo indicador no seu espelho de água. Já quase me perdi pelo caminho da palavra, é assim mesmo... Hoje, eu escrevi na urgência, às 2h25 da manhã, experimentando o que é a solidão - solidão mesmo, não solitude dessa vez. Solidão tamanha que posso ouvir o vento bater nas folhas. Cabe a mim ser eu e essa tem sido uma tarefa titânica, portanto, me empresta teu ombro imaginário que eu preciso, mesmo que imaginariamente, preencher um espaço, uma poça que seja do Tejo, um rio que seja, riacho até. Qualquer coisa, hoje, agora, para já, com a urgência de quem sempre espera. Tenho mudado, isso me assusta. Mas também me dá vida. Ao mesmo tempo que a vontade quase não me vem, sinto-me vibrando, construindo, aguardando inconscientemente nos confins de mim, na minha caverna, onde eu converso com morcegos e serpentes, as coisas de outubro. Dia desse tirei o tarô, o sol manifestou-se voluntariamente, isso quer dizer, que, por puríssima magia, uma carta virou-se sozinha para me iluminar, o Sol - essa marca em minha alma. Outra coisa do tarô que me veio foi a Imperatriz dizendo-me que ela era eu - aquela que cuida de sua beleza e de suas posses e que toma o que é seu. Sim, leitor, eu não peço, eu tomo. Eu tomo o que me é de direito, talvez isso faça de mim uma perversa, alguém com baixísso nível moral, mas a moral quase nunca me serviu, embora eu seja polidíssima, dificilmente estarei a serviço de moral alguma, sou muito jovem para isso. Chega, já ando falando demais, hoje já é amanhã. Até mais, leitor. Não esqueça de se banhar diferentemente no Rio da vida, contra a correnteza, de preferência.

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